Perfil

Minha foto
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil
Professora, Mestre em Educação, Psicopedagoga, Especialista em Avaliação Educacional. Atualmente, ministra palestras sobre LEITURA E INTELIGÊNCIA, também escreve material de língua portuguesa EAD para o CCAA e para a EDUCOPÉDIA.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

SOU BRASILEIRA



Numa sala de aula, o professor explica à seus alunos a diferença entre os modos de agir dos povos ocidentais e daqueles criados longe dessa cultura, como o índio, o africano e mesmo o povo brasileiro que vive longe das cidades e da escola.
- O Europeu, explica ele, é diferente do brasileiro, do povo brasileiro, da massa. O Europeu lê o jornal pra ele. O brasileiro pega o jornal, senta na sala e... mal começa a leitura, já está comunicando à todos as principais manchetes. Não satisfeito em comunicar, ainda comenta. E ai de quem não prestar atenção! Interrompe a novela, o filme, a mulher que está na cozinha... ele envolve toda a casa em sua leitura! A carapuça cai como uma luva. Sentada na sala, eu me lembro de, ao ler uma notícia, chamar filhos, marido, mãe:
- Tá vendo, filho? pergunto eu, num tom um pouco mais alto, ao filho que está no quarto, e continuo: - Olha essa menina que foi assaltada.... estava de madrugada na rua... depois, dirigindo-me ao meu marido que dividia a sala comigo: “ - Nossa, mô! Olha que pulseira linda!” E, imediatamente após, divido com a mãe que está na cozinha: - Mãe, viu essa receita de lasanha de berinjela? As falas são quase o reflexo do pensamento... não esperam muito por respostas. Apenas soam como eco...
- O Europeu, continua ele, lê as histórias para os seus filhos.... nós, fazemos teatro. Ao contar a história do “Chapeuzinho Vermelho” sendo comida pelo Lobo Mau, fazemos um bocão que quase engolimos a criança.... Nessa hora vi-me contando histórias para os meus alunos... imaginei meus olhos ARREGALADOS, minha boca BEM ABERTA e toda a minha expressão para relatar a cena! e que esforço fazia para ser bem sucedida! nesse momento fiquei em dúvida... sempre acreditei que o fato de contar uma história expressivamente contribuía para aproximar o ouvinte do texto. De repente me deparo com um outro paradigma: um texto é para ser lido!
Ele continua dizendo que nos apropriamos da leitura e da escrita de um modo muito peculiar... escrevemos como falamos! Sim, penso comigo mesmo, posso ver isso nos textos dos alunos pequenos... .quando o aluno escreve: “e ae rapa, cê ta bom?” Ele emprega regras da linguagem oral, ignorando que existem regras próprias para a língua escrita. Mas ele continua... não são só as crianças que fazem isso! Os adultos também! A certeza com que falava fazia com que eu procurasse em minhas lembranças exemplos que comprovassem sua fala. Sim, claro. Meus alunos da faculdade! Eles também fazem isso. Ao longo do texto não deixam claro as pessoas que falam, usam gírias e palavras de uso oral em textos acadêmicos e desconsideram a ortografia das palavras. E também quando a professora repete exautivamente a palavra “TO-MA-TÊ” enfatizando o ê no final da palavra, a crença dela é que a gente escreve como se fala e ensina isso para as crianças que se habituam a fazer a correspondência fonética entre fala e escrita... mas nem sempre isso funciona, simplesmente por que não escrevemos como falamos.
Por último, ele aborda a questão do planejamento. “ O europeu planeja tudo! Já o brasileiro não sabe planejar... trabalha sempre com o aqui e agora... Mas, também tem uma coisa, se alguma coisa dá errada, o europeu não sabe o que fazer... já o brasileiro, é mestre em dar jeitinhos... o famoso jeitinho brasileiro.” Nossa! Não é que é verdade? Pelo menos do ponto de vista dos brasileiros... penso eu. Nós estamos sempre atrasados, nós os brasileiros, de um modo geral, mas não eu! Eu odeio chegar atrasada e odeio esperar por alguém mais do que dez, quinze minutos. Isso é um problema de planejamento! Fico pensando nas festas, nas escolas, nas empresas... a gente sempre pode observar um aspecto em que o planejamento falhou ou está falhando...Em matéria de teoria o que não falta são publicações sobre o tema até porque é de suma importância. Nas empresas é chamado de planejamento estratégico. Nas escolas de Projeto Político Pedagógico e por aí vai.
Mas o que não podemos negar, e é neste aspecto que o professor em questão tem seu mérito, é que o povo brasileiro, ao se constituir as margens da cultura acadêmica, desenvolveu um tipo de pensamento muito peculiar, diferente do pensamento científico, e que ainda é necessária muita pesquisa para dar conta de entender o pensamento desse povo maravilhoso que tem suas bases ancoradas na oralidade, musicalidade, ritmo e um fazer artesanal dos negros, índios e europeus.

domingo, 5 de abril de 2009

“No mundo dos livros” de José Mindlin, 2009, 103 páginas.


Por Leila Mendes
Nesta obra, José Mindlin presenteia o leitor com uma história. A sua própria história de relação com a leitura e com os livros que acabaram por formar a sua biblioteca. Mindlin faz questão de frisar, em várias partes da obra, que sua primeira paixão é e sempre foi a leitura, sendo a biblioteca uma consequência dessa paixão. Assim, o autor vai recheando a obra com àquelas lidas ao longo de sua vida, oferecendo-nos uma deliciosa degustação daquilo que contribuiu para a sua formação, permitindo-nos, igualmente, relembrar alguns títulos e ter aguçada a curiosidade para outros.
Na introdução Mindlin faz uma pequena alusão à história do livro, iniciando na Antiguidade quando estes eram orais ou esculpidos em pedra até a invenção de Gutemberg. No entanto, lamenta que ainda tantas pessoas não tenham acesso à leitura no Brasil.
No primeiro capítulo Mindlin reflete sobre a importância da leitura, atribuindo a esta, um sentido espiritual à vida. Além disso, argumenta que a leitura é fundamental, pois que possibilita a correção de males sociais, além do papel didático e político. Lembra, com propriedade, para enfatizar a importância dos livros e da leitura, sobre as censuras impostas a estas pela igreja e governos ditadores, lembrando-nos que, em longo prazo, a censura nunca vence e que um livro, da mesma forma que se presta à reflexão e formação, também diverte e informa. Assinala ainda, que é irrelevante, que as primeiras leituras sejam ou não literárias. O importante é que se leia. A seleção, diz ele, vem com o tempo. Continua assumindo-se um entusiasta da leitura, da mesma forma que procura fazer outros, aumentando o universo de leitores. Finaliza dedicando uma reflexão ao papel da escola na formação de leitores e sugerindo a formação de bibliotecas públicas de modo a facilitar o acesso aos livros a uma parcela maior da população. Sugere ainda, às escolas a inclusão de um segundo recreio: a hora da leitura! Nessa hora o professor leria textos em voz alta para os alunos e favoreceria comentários pois, para Mindlin, todo leitor tem, na sua história, alguém que na sua infância o iniciou no universo da leitura.
No segundo capítulo, “Mundo da Leitura”, o autor desenvolve um relato da importância da leitura na sua infância e adolescência e as obras que o marcaram. D’As minas do Rei Salomão à Alice no país das maravilhas, o autor passeia por autores brasileiros, portugueses, franceses, americanos. Desde cedo falando o inglês e o francês, Mindlin tem acesso a literatura mundial muito cedo. Mais uma vez, enfatiza o prazer que a leitura deve dar, citando o lema de Montagne : “Não faço nada sem alegria”.
No terceiro capítulo, “Algumas obras de não ficção”, Mindlin discorre sobre algumas leituras que, embora não sendo de ficção, não podem deixar de ser citadas: A bíblia, O Alcorão, O capital, de Karl Marx, além de Os Sertões, Discurso do Método, entre outros.
“Começo da biblioteca”, e “Garimpagem”, quarto e quinto capítulos respectivamente, relatam como o leitor Mindlin inicia sua biblioteca e como esta está dividida. A leitura da bibliografia dos autores que gostava, levava-o à outras obras do mesmo autor que garimpava nos sebos. Depois o interesse por livros autografados, que o remetem a uma “ espécie de contato direto com os autores e os leitores a quem os livros eram dedicados.”, a amizade com os livreiros de várias partes do mundo e as artimanhas usadas para a aquisição dos primeiros exemplares em sebos, além da estratégia de negociação na aquisição de títulos raros. Além disso, a importância de ter trabalhado, antes de completar 16 anos, na redação d’O Estado de S. Paulo.
No sexto e último capítulo, “Leituras Variadas”, Mindlin nos brinda com, como o título sugere, um breve comentário das obras que leu ao longo dessas oito décadas, não sem antes advertir-nos sobre aquilo que ele considera grande livros: “os que foram escritos no passado, agradaram, empolgaram e sobreviveram ao tempo”. São grandes livros: Em busca do tempo perdido, de Proust, Grande Sertões Veredas de João Guimarães Rosa, ou a Servidão humana, de Somerset Maugham, entre outros. . Mas engana-se quem espera um descrição monótona, obra por obra. Mindlin escreve num tom autobiográfico, costurando digressões e reflexões entre uma obra e outra, como a importância da releitura. Além disso, situas as obras no tempo histórico e apresenta os autores naquilo que têm de mais importante. Sem dúvida, vale a leitura.